sábado, 19 de março de 2016

Chá de ayahuasca pode, sim, causar psicose e até matar

Chá de ayahuasca pode, sim, causar psicose e até matar 
 


Veja - Por: Giulia Vidale
O consumo do chá teria contribuído para a morte do neto de Chico Anysio. Especialistas ouvidos pelo site de VEJA explicam que a substância é alucinógena e, como qualquer outra droga com esse efeito, pode causar distúrbios psiquiátricos permanentes e até matar

Rian Brito, neto de Chico Anysio, foi encontrado morto em uma praia do Rio de Janeiro. Segundo seus pais, o rapaz passou a apresentar distúrbios psiquiátricos após consumir chá de ayahuasca em reuniões da seita Porta do Sol(Reprodução/Facebook)

Recentemente, Brita Brazil e Nizo Neto - filho de Chico Anysio - atribuíram a morte do filho Rian Brito ao chá de ayahuasca. De acordo com a família, o rapaz teria mudado muito após tomar a bebida.

"Começou com uma questão espiritual. Ele logo entrou num delírio que tinha uma missão e que para essa missão não podia comer. Consumindo o mínimo para sobreviver, chegou a pesar 45 quilos. Existe o Rian antes e depois da ayahuasca, embora ele só tenha tomado quatro doses. Com toda certeza foi uma coisa que o levou a esse final. Três psiquiatras também fizeram essa afirmação", disse Nizo Neto, em entrevista ao site Ego.

O chá de ayahuasca ou Santo Daime, como é conhecido, é uma bebida alucinógena feita a partir de uma combinação de duas plantas amazônicas: o cipó jagube e o arbusto chacrona. Embora seja considerado um alucinógeno, seu uso em cultos religiosos como o Santo Daime , Porta do Sol (frequentada por Rian), Céu de Maria (fundada pelo cartunista Glauco e onde seu assassino, Carlos Eduardo,consumia a bebida) e União do Vegetal é permitido no Brasil pelo Conselho Nacional de Políticas sobre Droga (Conad).

Apesar da liberação, o Conad impõe algumas regras para o consumo do chá: pessoas com histórico de transtornos mentais ou sob efeito de bebidas alcoólicas ou outras substâncias psicoativas estão proibidas de ingerir a droga. Também é obrigatório que as seitas do Daime "exerçam rigoroso controle sobre o sistema de ingresso de novos adeptos".

Para Ronaldo Laranjeira, professor titular de psiquiatria da Unifesp, essa autorização é bastante problemática. Segundo ele, os integrantes da seita não têm capacidade para discriminar quem pode ou não ingerir a substância sem apresentar problemas. Além disso, como acontece com o uso de qualquer outra droga, não é possível afirmar quem vai ficar psicótico ou, caso já tenha algum problema mental, quem vai piorar.

"O grande problema dessa resolução é que não é possível prever quem terá problemas psiquiátricos após beber o chá ou quem ficará viciado. Claro que algumas pessoas, por seu histórico médico ou familiar, já têm predisposição, mas qualquer um pode ser afetado. É uma questão de genética e vulnerabilidade sobre a qual ainda não temos um conhecimento sólido", afirma o psiquiatra.

A combinação de plantas e ervas do líquido espesso e amarronzado contém DMT (n-dimetiltriptamina) e inibidores da monoamina oxidase. Essas substâncias agem no sistema nervoso central promovendo visões psicodélicas e euforia. Seus usuários acreditam que o chá proporciona iluminações transcendentais.
"A ideia é promover uma comunhão com a natureza, uma união com o universo. O efeito alucinógeno altera a percepção sensorial de todos os sentidos permitindo aos usuários essa sensação de fazer de parte um todo no universo", explica Analice Gigliotti chefe do Setor de Dependência Química da Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro e diretora da clínica psiquiátrica Espaço Clif.

Embora o chá de ayahuasca possa desencadear surtos psicóticos em qualquer indivíduo, alguns grupos são considerados de risco, como pessoas com depressão, transtorno bipolar e esquizofrenia. "As substâncias presentes no chá, como o DMT, agem como perturbadores do sistema nervoso central, alterando a percepção sensorial de todos os sentidos. Isso faz com que a pessoa possa ter alucinação, o que pode desencadear quadros psicóticos", diz Analice.

Além da deflagração de surtos psicóticos, quando combinado com outras substâncias, o chá pode causar confusão e tremores - em usuários de antidepressivos, devido ao excesso de serotonina no sistema nervoso central - e até mesmo morte súbita. A função cardiovascular de pessoas que já têm problemas cardíacos também pode ser alterada, o que traz riscos para a saúde destes indivíduos.

Estudos - Nos últimos anos houve uma popularização do chá de ayahuasca, aumentando o interesse, inclusive científico, em relação aos efeitos da substância. Um estudo publicado em 2014 na Revista Brasileira de Psiquiatria mostrou que o líquido pode ser um potencial tratamento para depressão.

De acordo com pesquisadores da Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto (SP), a ingestão de uma dose do chá (2,2ml/kg de peso) ajuda a reduzir em 66% os sintomas da doença. O estudo foi realizado com seis pacientes com histórico de depressão. Sete dias após o uso, a diminuição dos sintomas foi superior a 72%. Em relação aos efeitos adversos, os participantes relataram apenas vômito, que é comum em usuários do chá.

Outras linhas preliminares de pesquisa realizadas por cientistas espanhóis analisam o uso do chá no tratamento de vícios de outras drogas. Entretanto, todos os estudos, inclusive o brasileiro, ainda são limitados e preliminares, e os pesquisadores ainda estão tentando entender o modo como a substância afeta o cérebro.
Fonte:UNIAD - Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas 


Privação de sono tem impacto no apetite semelhante à maconha

Privação de sono tem impacto no apetite semelhante à maconha   
 

Revista Veja
Um experimento mostrou que noites mal dormidas aumentam o desejo por alimentos “gordos” e têm efeito similar ao da fome excessiva comum em usuários da droga


A maconha ativa o sistema endocanabinoide e leva as pessoas a comerem demais quando não estão com fome. A privação de sono pode causar excessos na dieta ao agir da mesma maneira. (Getty Images/VEJA)

A privação do sono aumenta a vontade por alimentos com excesso de sal, açúcar ou gordura, em um efeito similar ao da fome excessiva ou "larica" comum em usuários de maconha. É o que diz um estudo publicado recentemente na revista científica Sleep.
Pesquisadores da Universidade de Chicago submeteram 14 voluntários com cerca de 20 anos de idade a um experimento para analisar os efeitos da privação do sono no apetite. Durante oito dias, os participantes ficaram "internados" em um laboratório da universidade. Nos primeiros quatro dias, eles puderam dormir, em média, sete horas e meia por noite. Já nas últimas quatro noites, o tempo de sono foi reduzido para quatro horas e 15 minutos.

Durante todo o estudo eles receberam as mesmas porções de café da manhã, almoço e jantar. No último dia, porém, os participantes relataram sentir fome, mesmo após terem ingerido 90% das calorias diárias recomendadas. Os pesquisadores, então, ofereceram diversos lanches, entre alimentos saudáveis e gordurosos e os quitutes foram mais populares. A ingestão destes alimentos correspondeu a um consumo de calorias 50% maior e duas vezes mais gordurosos em relação aos dias em que eles haviam dormido bem.

Os pesquisadores também mediram os níveis de grelina e leptina, hormônios respectivamente associados ao estímulo do apetite e à sensação de saciedade e, pela primeira vez, do endocanabinoide 2-araquidonoilglicerol (2-AG). Este componente amplifica o desejo pela ingestão de alimentos e faz parte do mesmo sistema que é alvo do ingrediente ativo da maconha. Os resultados mostraram que o 2-AG estava 33% mais alto após os voluntários dormirem pouco.

Normalmente, os níveis de 2-AG atingem seu pico por volta de meio-dia e diminuem ao longo do dia. Entretanto, entre as pessoas que dormem poucas horas, esse índice é mais elevado desde cedo -- chega ao pico por volta das 14h00 e permanece alto até às 21h00, o que aumenta a tentação pelos "lanchinhos" gordurosos.

"Sabemos que a maconha ativa o sistema endocanabinoide e leva as pessoas a comerem demais quando não estão com fome, e normalmente elas se alimentam de doces saborosos e gordurosos. A privação de sono pode causar excessos na dieta ao agir da mesma maneira", disse Erin Hanlon, principal autora do estudo.
(Da redação)
Fonte:UNIAD - Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas