A CAPACIDADE DE REORIENTAR-SE
Pe Otair
Cardoso da Cruz
Entre os ditos populares, encontramos muitas expressões que
apontam para a realidade comportamental como sendo algo imutável, isto é,
impossível de ser modificado; por exemplo: “Pau que nasce torto nunca se
endireita”, ou ainda, “Burro velho não pega trote”. Esse tipo de compreensão,
oriundo da sabedoria popular, sinaliza para uma descrença na mudança do sujeito,
em razão da reprodução contínua de comportamentos inadequados na sua atuação
social.
Não há dúvidas de que nessa forma de saber popular encontram-se
aspectos de extrema relevância para a vida em sociedade. No entanto, não
podemos desconsiderar o fluxo livre do desenvolvimento e as novas conquistas
científicas que ampliam nossos horizontes e nos permitem encontrar outros
significados para a compreensão das expressões de comportamento, manifestados
socialmente.
Diante do exposto, e em posição de discordância com os
jargões populares supracitados, compreendemos que a “crença” ou a ideia
cristalizada de que é impossível a mudança de pessoas contraventoras, não se
ajusta na sua totalidade ao ser humano. Pensar assim é desconsiderar o potencial
existente, em cada pessoa, bem como as possibilidades de reorientação e
ressignificação de sua estrutura comportamental.
Não é incomum encontrarmos pessoas que aparentam ter desistido
de si mesmas e que se consideram um “caso perdido”. Entretanto, não podemos
esquecer que, no decorrer do desenvolvimento dessas pessoas, inúmeros direitos
lhes foram negados, tais como o afeto e o carinho necessários, a estimulação
adequada para o descobrir e aprender, um ambiente harmonioso e não hostil e
turbulento, a paz e a tranquilidade, ao invés de agressões e violências, o
incentivo à autonomia, ao contrário dos rótulos seguidos de palavras de baixo
calão, a que normalmente estiveram
expostos.
Desse modo, entendemos que a percepção negativa que o sujeito
elaborou sobre si mesmo, ratificada no embate com os diferentes núcleos
sociais, reforça a falsa ideia de que ele “nasceu
assim, cresceu assim e vai ser sempre assim”. Isso não é verdade! A mudança
é um aspecto inerente ao ser humano e não há possibilidade de pensá-lo, senão
dentro desta dinâmica de mudança impelida pela natureza.
Não queremos, com essa maneira de tratar o problema,
descartar as dificuldades de ordem psiquiátrica existentes, como um fator
complicador na implementação das mudanças. Ao contrário, sabemos que elas inspiram
cuidados; porém, até mesmo nestes casos a busca é pela melhora do sujeito, cujo
intuito é explorar ao máximo o que ele é capaz de oferecer dentro de um processo
de intervenção.
A decisão de mudança impele o sujeito a tomar posse de suas
habilidades e limitações. E a consciência de que ela é necessária, o leva a empreender
esforços para não reincidir nas mesmas atitudes ou comportamentos que lhe
causaram transtornos.
É possível, sim, desenvolver um estilo de vida eficiente de
interação social e estabelecer relações construtivas e assertivas quando, da parte
do sujeito, há o desejo de mudança. Não podemos assumir o papel de
protagonistas na história e na vida de nenhuma pessoa, mas, também não sejamos
antagonistas, manifestando nossa pouca credibilidade na transformação do mesmo.
Sejamos coadjuvantes, no sentido de dar suporte para que elas brilhem e
apresentem, para nós, o que eles possuem de melhor. Deixemos de olhar para as
nossas transgressões, como sendo o fim último, e valorizemos, antes, o poder
que temos para reorientar e resinificar - mesmo que a duras penas - a nossa
maneira de olhar, compreender e atuar no palco da vida.
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