segunda-feira, 3 de outubro de 2016

Álcool: da prevenção ao tratamento


 

Por Arthur Guerra de Andrade
Psiquiatra e Presidente Executivo do CISA

O consumo de álcool faz parte da cultura humana há milhares de anos, muito atrelado a relações de socialização e não costuma causar problemas para a maioria dos consumidores. Inclusive, pode até levar a potenciais benefícios para o sistema cardiovascular, quando consumido de forma leve a moderada. Entretanto, não podemos relevar o fato de que uma minoria das pessoas desenvolve situações graves, cujos danos para a saúde individual, coletiva e econômica são expressivos. Portanto, é importante nos atentarmos a este tema, tanto em termos de prevenção como tratamento – e para isso a informação é ferramenta essencial.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), não existe um limite considerado seguro para consumo de álcool. Os riscos de problemas de saúde aumentam especialmente se o indivíduo bebe mais de 2 doses* por dia e não deixa de beber ao menos 2 dias na semana. Alguns adultos, mesmo com consumo moderado, estarão mais vulneráveis aos problemas decorrentes do beber ao longo da vida, assim como algumas pessoas em situações nas quais o álcool pode ser prejudicial em qualquer quantidade – por exemplo, menores de 18 anos, gestantes, quem pretende dirigir ou quem faz uso de medicamentos que interagem com o álcool.

O Brasil tem avançado bastante em termos de prevenção – a exemplo da Lei nº 13.106/2015, que tornou crime vender ou entregar bebidas alcoólicas a crianças ou adolescentes, e as mudanças na legislação sobre álcool e direção somadas à fiscalização da chamada “Lei Seca” (Lei nº 12.760/2012). Além de estabelecer tolerância zero para o consumo de álcool por motoristas em todo país, aumentou a punição e ampliou as possibilidades de provas para a infração.

Em relação à dependência de álcool (alcoolismo), é importante esclarecer que é uma doença crônica e multifatorial; isso significa que diversos fatores contribuem para o seu desenvolvimento, incluindo a quantidade e frequência de uso do álcool, a condição de saúde do indivíduo e fatores genéticos, psicossociais e ambientais.

Dados divulgados pela OMS indicam que, em 2010, 5,6% da população brasileira apresentava algum transtorno relacionado ao uso de álcool e 2,8%, dependência. Alguns de seus sintomas podem ser: forte desejo de beber, perda do controle, uso continuado apesar das consequências negativas, maior prioridade dada ao uso da substância em detrimento de outras atividades e obrigações, tolerância (necessidade de doses maiores de álcool para atingir o mesmo efeito anterior) e abstinência (sudorese, tremores e ansiedade quando a pessoa para de beber).

A dependência do álcool causa grande impacto na vida do indivíduo e também daqueles que estão ao seu redor. A família, em especial, é peça-chave tanto na prevenção do uso nocivo, como nos casos em que o problema já está instalado. Inclusive, não são poucas as vezes em que o tratamento inicia-se pela família, principalmente porque o indivíduo não aceita seu problema, não reconhece que o uso de bebidas alcoólicas lhe traz prejuízos ou está desmotivado para buscar ajuda.

Felizmente, a maioria das pessoas com transtornos por uso de álcool que busca tratamento é capaz de reduzir ou até cessar seu consumo. Ainda, estima-se que um terço das pessoas não apresenta sintomas após um ano em tratamento. Entender as opções disponíveis, como terapias comportamentais e medicamentosas, é o primeiro passo e a adesão ao método de escolha será fundamental. No Brasil, os mais conhecidos tratamentos gratuitos especializados são os Centros de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (CAPS-AD) e Hospitais públicos e conveniados ao Sistema Único de Saúde (SUS).

De maneira geral, estamos construindo ferramentas para prevenir o uso nocivo do álcool e temos linhas de tratamento cada vez mais eficazes. Contudo, é importante frisar que nenhuma ação isolada ou a implementação de novas leis poderá resolver este sério problema enquanto a população também não se envolver e apoiar. Somente com um trabalho em conjunto, que contemple governantes, pais e familiares, profissionais da saúde, academia, educadores, instituições privadas e a sociedade como um todo, poderemos nos aproximar de uma solução eficaz para este desafio que permeia o Brasil e o mundo.

* Uma dose padrão contém aproximadamente de 10 g a 12 g de álcool puro, o equivalente a uma lata de cerveja (330 ml) ou uma dose de destilados (30 ml) ou ainda a uma taça de vinho (100 ml).
Fonte:CISA - Centro de Informações Sobre Saúde e Álcool 

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