Voluntária faz atendimento no telefone pelo SOS Preces, no qual frequentemente há pessoas que precisam de orientação e conforto contra pensamentos de autoextermínio (Foto: Marcelo Ribeiro)
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Campanha durante todo o mês chama atenção para o problema de suicídios e a necessidade de falar sobre as formas de se combatê-lo. Somente este ano na cidade, foram 11 registros
Por Marcos Araújo
O telefone toca. Respiração ofegante. De um lado, um coração solitário. Do outro, um coração solidário. No primeiro, a busca por uma palavra de conforto. No segundo, a vontade de confortar por meio da palavra. Uma conversa amiga pode ser a tábua de salvação para quem está às voltas com pensamentos suicidas. Uma estilista juiz-forana, de 38 anos, já passou cerca de 90 horas ao telefone, ao longo de um ano e meio, atendendo ligações como plantonista voluntária e anônima no SOS Preces, trabalho de valorização da vida desenvolvido pela Fundação Espírita Allan Kardec (Feak). O serviço atende aproximadamente 200 pessoas por dia, e 10% delas têm tendência ao autoextermínio. Em Juiz de Fora, 31 pessoas cometeram suicídio em 2016, conforme dados da Polícia Militar. Este ano, até maio, 11 ocorrências já haviam sido registradas. Os números se assemelham aos divulgados pelo Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, que aponta, em 2014, a morte de 33 pessoas por autoextermínio na cidade, contra 32 em 2013. De acordo com o Mapa da Violência, o município ocupava em 2012 a 707ª posição no país. O tema ganha destaque este mês diante da criação da campanha Setembro Amarelo. Em Juiz de Fora, haverá programação para debater o assunto (ver quadro).
Em todo o planeta, os registros surpreendem, pois estima-se que, a cada 40 segundos, uma pessoa tire a sua própria vida, de acordo com dados da Organização Mundial de Saúde (OMS). São 800 mil suicídios registrados por ano em todo o mundo. No Brasil, são 12 mil anualmente, o que coloca o país em quarto lugar em termos percentuais e primeiro em números absolutos na América Latina. Dados tão alarmantes dão ao suicídio o status para ser tratado como problema de saúde pública. Para a OMS, o comportamento suicida é um fenômeno complexo, que tem vários motivadores inter-relacionados. As razões podem ser pessoais, sociais, psicológicas, culturais, biológicas e ambientais. Justificativas suficientes para que essa tragédia que leva prematuramente uma vida seja tratada com cautela, a fim de evitar simplificações ou conclusões precipitadas acerca do tema.
90% poderiam ser evitados
Para a voluntária da Feak, o suicídio significa que há alguém com depressão, com pensamentos negativos e que precisa ser ouvida e cuidada. “Temos que tentar contornar isso numa boa conversa, com uma palavra amiga, um conforto. Essas situações são delicadas, e nos sentimos na obrigação de reverter esse quadro”, afirma a estilista, ressaltando que o suicídio pode e deve ser prevenido.
Sim, ao contrário do que muitos pensam, 90% dos casos de suicídio consumados, como apontam estudos, são preveníveis, porque a pessoa tem algum tipo de transtorno mental, principalmente, quadros de depressão e problemas relacionados ao consumo de bebida alcoólica e outras drogas, que são possíveis de tratamento. De acordo com o professor de psiquiatria da Faculdade de Medicina da UFJF Alexander Moreira-Almeida, em um episódio agudo de depressão, o indivíduo fica com uma visão de mundo distorcida. “Ele se enxerga de forma pessimista e não tem boas expectativas sobre o futuro. Se considera um peso para outras pessoas e se vê em um grande sofrimento”, explica.
Quando o sujeito com tendência suicida tem um tratamento adequado, medicamentoso e psiquiátrico, consegue superar o transtorno e, no futuro, quando reavalia os pensamentos de autoextermínio, impressiona-se ao perceber o quanto sua mente estava limitada em relação à realidade à sua volta. “Hoje já se sabe que uma grande barreira ao tratamento é a autoestigmatização, na qual o paciente acha que se ele buscar o tratamento é um sinal de fraqueza e não percebe que é um problema que qualquer ser humano pode passar e superar”, ressalta o professor.
Isolamento social é sinal de alerta
Quando alguém passa a evitar, cada vez mais, contato social, mantendo-se isolado, derrotista, verbalizando pensamentos de morte, é preciso acender o sinal de alerta e apoiá-lo a buscar ajuda. Neste sentido, familiares e amigos têm papel primordial. Todavia, conforme aponta o psiquiatra e pesquisador Alexander Moreira-Almeida, não é adequado adotar a conduta de passar a mão na cabeça, o que pode gerar um tipo de manipulação emocional, mas é preciso contribuir para que a pessoa transtornada encontre meios de superar o sofrimento, oferecendo um ombro amigo e informações.
Entre 70% e 90% dos casos, os suicidas, de alguma forma, manifestam o desejo de acabar com a própria vida por meio de verbalização de ameaças, tentativas frustradas ou cartas de despedidas. A história de que quem ameaça não tem coragem de seguir em frente em busca pela morte é balela e, na visão do professor da UFJF, esses sinais não podem ser negligenciados. “Isso pode ser considerado como um pedido inadequado de socorro, pois a pessoa precisa de ajuda e não consegue se fazer ouvir e, muitos vezes, a fala e o comportamento de tentativa de suicídio podem ser um pedido de ajuda. Não significa que ela simplesmente quer chamar a atenção, embora isso também possa existir, mas não é o habitual”, pontua Alexander.
Efeito dominó
Poesia, romances, música, filmes, reportagens, transmissões na rede social. Farto é o material que aborda o suicídio, alguns até com orientações sobre como praticá-lo. Ao longo dos tempos, o ato de tirar a vida com as próprias mãos vem sendo tratado de forma ficcional e não-ficcional, e há a percepção de que isso pode influenciar as pessoas. Essa ideia faz referência ao escritor alemão Goethe que, em 1774, lançou o romance “Os sofrimentos do jovem Werther”. Ao morrer por amor, no final do livro, o personagem teria levado diversos jovens ao suicídio depois de lerem a obra. O fenômeno originou o chamado “Efeito Werther”, usado para descrever a imitação de suicídios. Segundo o professor de psiquiatria da Faculdade de Medicina da UFJF, Alexander Moreira-Almeida, o ato de se autoexterminar contagia, porque mostra que a pessoa não encontra uma solução e acaba morrendo, inspirando indivíduos que estão em situação de fragilidade.
O psiquiatra lembra que, na literatura médica, há um estudo que aponta que, quando se divulga o suicídio de modo muito sensacional, pode-se colaborar para o aumento de suas taxas. “Um exemplo clássico é o estudo a respeito do metrô de Viena, na Áustria, onde as pessoas pulavam para se matar. Isso começou a ser noticiado, e houve uma epidemia de óbitos. Esse círculo de mortes só terminou após uma articulação entre a Sociedade Austríaca de Psiquiatria e a mídia local, resultando na queda dos casos em 75%. Ele chama a atenção para a maneira como a imprensa juiz-forana noticia as mortes acontecidas ao longo da linha férrea que corta o município, pois, segundo ele, algo muito parecido pode estar acontecendo, como em Viena.
“O suicídio pode ser divulgado, mas é preciso evitar o sensacionalismo. O mais importante para prevenir é mostrar que muitas pessoas pensam em situação de suicídio, mas a imensa maioria encontra meios mais adequados e saudáveis para lidar com seus problemas. É preciso mostrar o inverso, no qual muitos passaram pelo problema e, no final, conseguiram encontrar um outro caminho. É muito comum na vida passarmos por situações e imaginarmos que não daremos conta e, depois, vemos que é possível. A mídia deve mostrar a importância do assunto, que a maioria dos casos é prevenível, que é possível buscar ajuda médica, religiosa, familiar, psicológica e que a maioria das pessoas consegue superar”, destaca o professor.
Qual a maneira de falar sobre o suicídio
No ano de 2009, a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) lançou o manual para a imprensa sobre como as notícias a respeito de suicídio devem ser tratadas, alertando a mídia para o fato de o comportamento suicida ser um ato de ambivalência entre o querer morrer e o querer viver de forma diferente. O jornalista André Trigueiro, autor do livro “Viver é a melhor opção”, que estuda o fenômeno do suicídio e as diferentes estratégias de prevenção desde 1999, ressalta que o tema é complexo e exige cuidado na sua abordagem, pois a prevenção se faz com informação. “No caso do suicídio, a informação vai ao encontro de uma estatística produzida para Organização Mundial de Saúde, dando conta de que, em pelo menos 90% dos casos, os suicídios estão relacionados a psicopatologias diagnosticáveis e tratáveis. Então, se as pessoas têm informação sobre essas patologias de ordem mental, elas podem, sim, se livrar da tendência ao suicídio. Tudo depende de como se fala, que cuidados e protocolos devem ser obedecidos para que, sim, isso seja visto como importante, para que se quebre o tabu sem, entretanto, afrontar os protocolos de segurança estabelecidos pela OMS na abordagem desse assunto”, considera Trigueiro.
Para ele, a cobertura da mídia sobre o tema, priorizando a prevenção, deveria, em resumo, evitar abrir espaços generosos com manchetes, fotos e imagens de casos de suicídio, evitando descrever em detalhes o método empregado. “Só falar de caso de suicídio quando isso for de interesse público. Neste sentido, seguindo esta e outras recomendações, a gente conseguiria diminuir o risco de pessoas fragilizadas psicoemocionalmente perceberem nesse conteúdo um fator de desequilíbrio.”
Necessidade de debate sobre políticas públicas
Prevenção ao suicídio também se faz com políticas públicas. No Brasil, em 2006, o Ministério da Saúde lançou a Estratégia Nacional para Prevenção ao Suicídio, numa tentativa de articular universidades, instituições de pesquisa, ONGs etc e apoiar as iniciativas que pudessem reduzir os óbitos e tentativas de suicídio no país, os danos associados aos comportamentos suicidas, assim como o impacto traumático do suicídio na família, entre amigos e companheiros, nos locais de trabalho, nas escolas e em outras instituições, como assinala o jornalista André Trigueiro em seu livro “Viver é a melhor opção”. Entretanto, há ainda muito o que se fazer para que essas estratégias resultem em um trabalho efetivo de prevenção.
Para André Trigueiro, o suicídio não faz parte das prioridades de saúde. Mas ele avalia que, de lá para cá, houve avanços. Um deles é o anúncio do Ministério da Saúde, tornando gratuitas, em todo o território nacional até 2020, as ligações feitas ao Centro de Valorização da Vida (CVV). “Quem liga para o CVV hoje, exceto no Estado do Rio Grande do Sul, onde a ligação é gratuita pelo 188, nos demais estado do Brasil onde o CVV está presente, existe o custo da tarifa local. Quando o Ministério da Saúde anuncia a gratuidade, está apoiando a mais antiga e eficiente organização que realiza um trabalho voluntário de apoio emocional e de prevenção do suicídio”, avalia.
fonte:antidrogas.com.br
A experimentação de bebidas alcoólicas por adolescentes com idade entre 13 a 15 anos subiu de 50,3% em 2012 para 55,5% em 2015, revela pesquisa
No mês de conscientização sobre a prevenção do suicídio, o alerta vai para o consumo do álcool entre adolescentes que tem aumentado e que pode estar associado aos registros de suicídio. Um problema de saúde pública que pode ser evitado em 90% dos casos, mas que, pelo contrário, é responsável por uma morte a cada 40 segundos. O suicídio, que ganhou repercussão mundial com a série “13 reasons why” e com o jogo Baleia Azul, tem crescido entre a população jovem. No Brasil, o Mapa da Violência de 2014 mostra que, entre 2000 e 2012, a taxa de suicídio de crianças e adolescentes entre 10 e 14 anos aumentou em 40%, enquanto que entre jovens de 15 a 19 anos o índice cresceu 33%.
Especialmente para esta parte da população, o uso de álcool torna-se um fator de risco ainda mais significativo. O alerta é do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (CISA), uma das principais fontes de informação sobre o tema.Segundo o estudo “Uso Adolescente de Substância e Comportamento Suicida: Uma Revisão com Implicações para Pesquisa em Tratamento”, o uso de substâncias amplia o risco de comportamentos suicidas, sendo que adolescentes suicidas apresentavam elevadas taxas de uso de álcool e drogas ilícitas.“Entre os adolescentes a partir de 16 anos, o consumo de álcool e o abuso de substâncias aumentam consideravelmente o risco de suicídio em tempos de sofrimento”, afirma Dr. Arthur Guerra, presidente executivo do CISA.
Ele explica que o consumo de bebidas alcoólicas por adolescentes compromete o sistema nervoso central (SNC), que ainda se encontra em desenvolvimento. Desta maneira, suas vias neuronais podem se tornar mais suscetíveis aos danos causados pelo álcool, podendo levar ao comprometimento de várias funções. Sob os efeitos do álcool, os jovens ficam mais propensos a comportamento de risco – incluindo brigas, sexo desprotegido ou não consensual, acidentes automobilísticos e suicídio. Bastaria então que o consumo de bebidas alcoólicas por menores de idade não ocorresse para que nossos jovens estivessem mais protegidos, correto? Correto, mas não é isto que vem acontecendo no Brasil.
Dados da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) de 2015, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostraram que, entre alunos de 13 a 15 anos, a experimentação de álcool subiu de 50,3% em 2012 para 55,5% em 2015. Além disso, 21,4% desses adolescentes relataram já terem sofrido algum episódio de embriaguez na vida. A pesquisa mostrou também que meninas dessa faixa etária estão bebendo mais que os meninos, sendo que a taxa de experimentação de álcool é maior entre elas (56,1% vs. 54,8%) e também o uso de álcool nos últimos 30 dias (25,1% vs. 22,5%).
Em 2016, o Estudo de Riscos Cardiovasculares em Adolescentes (ERICA) avaliou 74.589 adolescentes de 1.247 escolas em 124 municípios brasileiros. Cerca de 20% dos adolescentes consumiram bebidas alcoólicas pelo menos uma vez nos últimos 30 dias e, desses, aproximadamente 2/3 o fizeram em uma ou duas ocasiões no período. Entre os adolescentes que consumiam bebidas alcoólicas, 24,1% beberam pela primeira vez antes de 12 anos de idade.
“Precisamos colocar essas questões na agenda pública e priorizá-las. O diálogo com a sociedade a respeito do tema também deve ser ampliado. Não podemos esperar a repercussão de outra série ou jogos suicidas para falar sobre o assunto, por isso ações voltadas à conscientização sobre a prevenção, como o Setembro Amarelo, são importantes para jogar luz sobre o problema”, defende Dr. Arthur Guerra.
Saiba mais:
O Centro de Informações sobre Saúde e Álcool – CISA, organização não governamental criada em 2004 e qualificada como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) desde 2005, foi fundado pelo psiquiatra e especialista em dependência química Dr. Arthur Guerra de Andrade e consolidou-se como a maior fonte de informações no país sobre o binômio saúde e álcool. Por meio de seu website (www.cisa.org.br), disponibiliza um banco de dados que têm como base publicações científicas reconhecidas no cenário nacional e internacional, dados oficiais (governamentais) e informações de qualidade publicadas em jornais e revistas destinados ao público geral sobre o álcool e suas relações com o corpo, a mente e a sociedade.Para mais informações, acesse o site www.cisa.org.br ou os perfis da organizaçã o nas mídias sociais: Facebook (https://www.facebook.com/ pages/CISA-Centro-de- Informações-Sobre-Saúde-e- Álcool/166680883359856), Twitter (@CISA_oficial) e Instagram (@cisa_oficial).
Fonte: Diário do Nordeste
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Amostras de urina sintética prometem burlar exames toxicológicos com 100% de eficácia
Encontradas em quase toda esquina, as lojas de conveniência nos Estados Unidos vendem de tudo: refrigerantes, cigarros, salgadinhos, desodorantes, café, asinhas de frango, hambúrgueres, doces, bebidas, brinquedos e... urina.
Além de causar surpresa num ambiente desses, o último item se tornou pivô de controvérsia em um país onde empregadores têm carta verde do governo para pedir exames sobre uso de drogas antes de contratar alguém - e, em muitos casos, também depois da contratação, sem aviso prévio.
A situação se complica quando se leva em conta que os Estados Unidos enfrentam uma epidemia sem precedentes de opioides, que já mata mais de 100 pessoas por dia de overdose em todos grupos sociais e idades e rendeu um pronunciamento do presidente Donald Trump, na última terça-feira, que classificou a escalada das drogas como "um problema tremendo", do qual "ninguém está a salvo" .
Os opioides são drogas quimicamente semelhantes que interagem com os chamados receptores opioides de células nervosas no corpo e no cérebro. Podem ser substâncias proibidas, como heroína, ou analgésicos prescritos, como morfina, codeina, fentanil e oxicodona.
Produzidas por dezenas de empresas e geralmente vendidas online, amostras de urina sintética ou real desidratada prometem burlar exames e 100% de eficácia em resultados neutros para usuários de drogas.
A maioria delas, entretanto, é vendida para fins de pesquisa ou "fetiche", segundo os fabricantes. Mas há empresas que vão direto ao ponto, como o site "urinaultralimpa.com" (em tradução livre), que promete que "Passar num teste de urina nunca foi tão fácil!". Os donos do "Resolva Sua Urina Rápido", por sua vez, prometem vender a "melhor urina sintética para exames, criada para proteger sua vida privada em exames toxicológicos".
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Urinas sintéticas ou reais desidratadas são vendidas para fins de pesquisa ou fetiche, dizem fabricantes
Muitos fabricantes de urina sintética se apresentam como "conselheiros sobre testes de drogas". O argumento da proteção da privacidade também é usado por advogados, ativistas e ONGs americanas, que entendem os exames de drogas feitos por empresas como invasão da intimidade dos candidatos e pedem sua proibição em todo o país.
Enquanto não se chega a um consenso, o xixi artificial - ou em alguns casos real, vendido em versão desidratada, em pó - é vendido online por preços que variam entre US$ 15 e US$ 40 dólares (ou R$ 48 e R$ 130, aproximadamente).
Testes
Troy Evans trabalhou como policial por 26 anos no Estado do Colorado. Depois de se aposentar, há cinco anos, virou sócio de um laboratório que oferece testes de drogas para empresas e para o governo americano.
"Nossos flagrantes de tentativas de burlar os exames cresceram junto com a epidemia de opioides. O que percebemos é que pessoas que usam essas substâncias ilegais apelam para a urina artificial quando se candidatam a uma vaga", diz Evans a BBC Brasil.
"A reação dos fraudadores varia. Muitas vezes eles assumem quando são confrontados. Às vezes ficam agressivos, irritados", afirma. "Se for constatado o uso de urina falsa, o candidato é desclassificado na hora."
Ele explica que os testes são obrigatórios para empregos em agências do governo americano e para todos os motoristas profissionais do país - dos condutores do Uber a pilotos de caminhões.
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Em alguns setores, como para os motoristas profissionais, testes são obrigatórios
Nos demais setores, a exigência ou não de testes é uma escolha das empresas. Cada Estado tem regras específicas na hora dos testes, mas a maioria obedece um padrão: o candidato precisa esvaziar os bolsos, tirar casacos e deixar todos os objetos pessoais fora da sala de coleta.
Um exame rápido é realizado na amostra recém-coletada, na presença do paciente. Se houver resultado anormal ou se o candidato mostrar sinais de nervosismo, uma nova coleta é feita na presença do testador, que pode exigir inclusive que a pessoa fique nua para garantir que não haja interferência.
"Temperatura e cheiro são os principais sinais de adulteração. Não tem como uma amostra ter calor muito diferente de 36 graus, que é a temperatura humana. Meu trabalho também inclui avaliar a cor e o cheiro, que é muito característico, e isso me orienta a aceitar a amostra ou pedir nova coleta", afirma.
As empresas conhecem as táticas de Troy e seus colegas de profissão, e vêm investindo em amostras sintéticas mais refinadas, com adesivos que mantém a urina na temperatura do corpo humano.
Algumas vão além: fabricantes como o Serious Monkey Business vendem próteses realistas de pênis acopladas a bolsas quentes, que supostamente são capazes de driblar os testes feitos com acompanhamento.
As próteses são vendidas nas versões "branco", "bronzeado", "latino", "moreno" e "negro" para, segundo a empresa, "combinar com qualquer tom de pele".
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Alguns fabricantes oferecem próteses de pênis acopladas a bolsas quentes
Fetiche?
A reportagem procurou três fabricantes de urina sintética. Duas não responderam os pedidos de entrevista e a terceira afirmou que não fala com a imprensa.
Todas elas oferecem serviços 0800 para tirar dúvidas de clientes. A BBC Brasil conversou com um dos atendentes.
"Somos um fabricante de urina para fetiche, senhor". A reportagem diz que precisa fazer um teste para um processo seletivo. "Nossa urina para fetiche é igual à real e não é detectada em testes, garantindo resultados neutros, mas não tem esta finalidade."
A reportagem insiste pedindo detalhes sobre como utilizá-la para testes. "Não recomendamos que use micro-ondas para aquecer as amostras, mas elas vêm com tiras de calor que garantem os padrões exigidos em testes e melhoram a experiência de fetiche em relações sexuais."
As alusões ao uso por fetichistas adeptos da "chuva dourada" (urinar sobre o parceiro em relações sexuais) colocam os fabricantes em uma zona cinzenta na legislação americana, que não tem leis federais para restringir ou controlar as vendas de artigos sexuais do tipo.
Frente a popularização da urina falsa em exames, entretanto, dois Estados (Indiana e New Hampshire) proibiram recentemente a comercialização e o porte do líquido.
"Os testes de drogas antes da contratação são muito comuns nos EUA e são legais em todos os Estados", diz à BBC Brasil a advogada Kathryn Russo, da área de drogas e álcool no mercado de trabalho do escritório Jackson Lewis.
Ela explica que os testes de urina são os mais comuns para a identificação de drogas como heroína, cocaína e maconha no organismo de candidatos, mas que os testes vêm evoluindo e hoje também podem ser feitos no cabelo ou na saliva.
"É preciso que haja uma regulação (na venda da urina falsa). Mesmo que se proíba, ainda vão dar um jeito de disponibilizar ilegalmente. Mas é preciso que haja consequências previstas para quem apela para esse recurso. Se um empregado adultera seu exame, ele precisa saber a que consequências estará exposto", avalia.
Direitos e deveres
De outro lado, entidades como a American Civil Rights Union (ACLU), criada em 1919 para "preservar os direitos individuais e liberdades" dos cidadãos norte-americanos, criticam a realização de exames toxicológicos no ambiente de trabalho.
Os exames foram regulados por uma lei federal de 1988, que permitiu a empregadores testarem seus funcionários antes da contratação e depois, por sorteios realizados mais de uma vez ao ano.
A lei visa "proteger empregadores e empregados", com a garantia de um ambiente de trabalho livre de drogas.
"Os empregadores têm o direito de esperar que seus funcionários não estejam alterados no trabalho. Mas eles não podem ter o direito de exigir que os funcionários demonstrem sua inocência fazendo um teste de drogas", afirma a entidade.
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Lei de 1988 permite empregadores testarem funcionárioes antes e depois da contratação
Segundo a ACLU, o acompanhamento de coletas em banheiros é "degradante" e a possibilidade de falhas humanas nos diagnósticos expõe candidatos e funcionários a injustiças.
"A análise de urina revela não só a presença de drogas ilegais, mas também a existência de outras condições físicas e médicas, incluindo predisposição genética à doenças - ou gravidez", alega o órgão.
À BBC Brasil, a advogada Kathryn Russo afirma que mapeamentos que vão além da presença de drogas no organismo são ilegais e não devem ser realizados por empresas.
"Os testes só são feitos se o empregador quiser e eu recomendo que isso esteja muito claro em uma política interna de testes de drogas, para que todos saibam exatamente os seus deveres e direitos", afirma.
Estados como Califórnia, Nova Jersey, Massachusetts e Virgínia Ocidental criaram leis que restringem empregadores de realizarem testes aleatórios em funcionários, sem que haja uma comprovação de suspeita de uso de substâncias controladas.
Fonte: BBC
Uso de cocaína antes dos 18 anos provoca maiores prejuízos a funções do cérebro como atenção e memória
Foto: Juniorbolivar/Wikimedia Commons
Jornal USP
Alterações mais pronunciadas no desempenho cognitivo são encontradas em usuários precoces da substância
Por Júlio Bernardes - Editorias: Ciências da Saúde
Usuários de cocaína de início precoce, antes dos 18 anos, exibem alterações neuropsicológicas mais pronunciadas, com prejuízos nas funções do cérebro. A constatação é feita em pesquisa do Instituto de Psiquiatria (IPq) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) que avaliou 103 dependentes da substância. O estudo liderado pela neuropsicóloga Bruna Mayara Lopes aponta ainda que os usuários precoces tem maior frequência de consumo de outras substâncias, como álcool e maconha, do que o grupo de início tardio, após os 18 anos.
A adolescência é um período crucial para o desenvolvimento neurológico. “Nessa fase da vida, o cérebro está em transformação, e acontece a chamada poda neural, quando neurônios sem uso são eliminados para refinar o funcionamento de outras áreas do cérebro, como o córtex frontal”, afirma Bruna. “Essa área é muito importante para a realização de funções executivas, tais como a memória do trabalho (capacidade de manter um número de informações enquanto executa uma tarefa), o controle inibitório e o planejamento. O uso de cocaína na adolescência pode levar a alterações, comprometimento e perda de funções cerebrais importantes para o dia-a-dia”.
A neuropsicóloga aponta que poucos estudos têm investigado o impacto do uso precoce da cocaína no desempenho cognitivo e nos padrões de uso de substâncias como álcool e maconha. “A pesquisa envolveu 103 pacientes dependentes de cocaína. Entre eles, havia 52 com início precoce, ou seja, que começaram a usar a substância antes dos 18 anos, em média por volta dos 15 anos. Outros 51 tiveram início tardio no uso de cocaína, após os 18 anos, em média com 21 anos”, relata. “Além disso, para comparar os resultados dos testes, foi avaliado um grupo controle com 63 pessoas saudáveis”.
Usuários precoces também têm maior frequência de consumo de outras substâncias, como álcool e maconha, do que o grupo de início tardio, após os 18 anos
Foto: Neo Tokio/Wikimedia Commons
Testes
O funcionamento neuropsicológico foi avaliado por meio de uma bateria de testes com duas horas de duração. “Os testes avaliaram a memória de trabalho, a atenção sustentada, ou seja a manutenção de foco durante a realização de uma tarefa e a memória declarativa, que é a capacidade de resgatar uma informação que foi recebida há 30 minutos”, explica Bruna. “O uso de álcool, maconha e tabaco foi avaliado por meio de questionário que mede o índice de gravidade de dependência”.”
De acordo com a neuropsicóloga, “as análises mostraram que o grupo de usuários precoces apresentou maior déficit cognitivo, com pior desempenho na atenção sustentada, na memória de trabalho e na memória declarativa em relação ao grupo controle”. O grupo de início tardio apresentou comprometimento na atenção dividida na comparação com as pessoas saudáveis. “Os usuários precoces também apresentaram maior uso de maconha e álcool do que os de início tardio”, acrescenta.
Usuários precoces apresentaram maior déficit cognitivo, com pior desempenho na atenção sustentada, na memória de trabalho e na memória declarativa.”
Os déficits cognitivos mais proeminentes nos usuários precoces provavelmente refletem um impacto negativo do uso de cocaína nos estágios do neurodesenvolvimento na adolescência. Isto pode estar relacionado com características clínicas mais severas do transtorno de substância neste subgrupo, incluindo abuso de outras substâncias, como álcool e cocaína. “O cérebro ainda pode se desenvolver até os 21 ou 22 anos, porém o uso precoce de cocaína pode causar prejuízo a áreas que estão em fase importante de formação”, afirma Bruna.
O estudo completo, publicado na edição de outubro de 2017 da revista Addictive Behaviors, pode ser acessado no site da publicação. Além de Bruna, o artigo é assinado por Priscila Dib Gonçalves, Mariella Ometto, Bernardo dos Santos, Mikael Cavallet, Tiffany Moukbel Chaim-Avancini, Maurício Henriques Serpa, Sérgio Nicastri, André Malbergier, Geraldo Busatto, Arthur Guerra de Andrade e Paulo Jannuzzi Cunha.
Mais informações: (11) 2661-7801, com Julieta Magalhães, na Assessoria de Imprensa do IPq
(imagem reprodução)
Cientistas dão um pequeno passo em direção a vacinas que auxiliem no tratamento da dependência
The Economist, O Estado de S.Paulo
Entre 2000 e 2015, 500 mil pessoas morreram de overdose de drogas, só nos Estados Unidos. Na maior parte dos casos, as mortes foram provocadas por opioides, uma classe de analgésicos, geralmente sintéticos, relacionados com a morfina, que provocam dependência química. No último dia 8, o secretário de Saúde dos Estados Unidos, Tom Price, mencionou o possível desenvolvimento de uma vacina para prevenir a dependência. Especialistas advertiram que isso está muito longe de tornar-se realidade. Mas há pesquisas em andamento. Estudo publicado na quarta-feira, por exemplo, relata a busca por uma vacina contra a fenetilina, droga bastante popular em certas regiões do Oriente Médio.
A fenetilina é um estimulante, não um analgésico. Também não é uma substância pura, e sim o resultado da combinação de duas drogas. Um de seus componentes é a anfetamina, que é, por si, só um estimulante bastante conhecido, para o qual há um grande mercado negro. O outro é a teofilina, usada no tratamento de problemas respiratórios, como a doença pulmonar obstrutiva crônica. A fenetilina foi desenvolvida nos anos 1960, com o nome comercial de Captagon, para tratar hiperatividade em crianças, mas não é mais empregada com essa finalidade. Apesar de sua comercialização hoje ser ilegal na maior parte do mundo, ela ainda é utilizada com fins recreativos. As apreensões da droga nos países árabes representam um terço do total de anfetaminas apreendidas no mundo. Na Arábia Saudita, 75% das pessoas tratadas por problemas com drogas são dependentes de anfetaminas, na maioria dos casos sob a forma da fenetilina.
Por causa de sua natureza dupla, há um debate entre os cientistas sobre a forma como a fenetilina atua. Em vista disso, Cody Wenthur, Bin Zhou e Kim Janda, do Instituto de Pesquisas Scripps, com sede em La Jolla, na Califórnia, decidiram tentar desenvolver vacinas contra seus dois componentes, contra os produtos de sua decomposição metabólica, bem como contra a droga como um todo, em um processo que os cientistas chamaram de “vacinação incremental”.
O desenvolvimento de qualquer vacina implica estimular o sistema imunológico a reconhecer a substância contra a qual se deseja proteger o organismo. Acontece que o sistema imunológico tende a reconhecer e criar anticorpos apenas contra moléculas grandes, como as proteínas. A maioria das drogas é muito pequena para ser reconhecida. É por isso que os fumantes e usuários de cocaína não desenvolvem imunidade contra seus vícios: a nicotina e a cocaína são invisíveis para o sistema imunológico. O mesmo acontece com a anfetamina e a teofilina.
Pequeno é problema. Vacinas contra moléculas pequenas podem ser desenvolvidas por meio da combinação de versões dessas moléculas com proteínas transportadoras, a fim de criar um complexo grande o bastante para provocar uma reação imunológica. A equipe do Scripps optou pela hemocianina, proteína derivada de um caramujo chamado “keyhole lipet” Megathura crenulata, que é particularmente eficaz nesse quesito.
A ideia dos pesquisadores era a seguinte: como os anticorpos são, por si só, moléculas grandes, se o sistema imunológico pudesse ser induzido a produzir anticorpos contra os componentes da fenetilina, a combinação das moléculas da droga com os anticorpos seria grande demais para atravessar a barreira hematoencefálica — sistema de células muito próximas umas das outras, que forra os vasos sanguíneos do cérebro, a fim de impedir a entrada de coisas perigosas no órgão. Mantidas do lado de fora do cérebro, as drogas não teriam como afetá-lo.
Para realizar o experimento, os cientistas utilizaram ratos de laboratório. Injetaram diversas versões de vacinas nos roedores e acompanharam de perto seu comportamento, prestando atenção principalmente em níveis incomuns de ansiedade e padrões estranhos de movimentação. Também verificaram os níveis de presença das moléculas da droga na corrente sanguínea e no cérebro dos animais.
A utilização da abordagem incremental permitiu que a equipe de pesquisadores acompanhasse os efeitos de diferentes moléculas nos padrões de atividade dos animais. Verificou-se, por exemplo, que a teofilina presente na fenetilina amplifica o efeito da anfetamina.
Mais importante que isso porém, foi observar os efeitos da vacina contra a fenetilina como um todo. Ao receberem uma dose da droga, os ratos em que essa vacina havia sido previamente injetada exibiram expressiva redução, na comparação com os animais não vacinados, no tipo de movimentos incessantes que a fenetilina provoca. Além disso, quantidade 30 vezes maior da droga permanecia bloqueada na corrente sanguínea, em vez de penetrar o cérebro dos ratos vacinados.
É um resultado promissor. Ainda que a ideia de uma vacina preventiva, como a desejada por Price, continue muito distante, o estudo mostra que talvez seja possível desenvolver um imunizante para tratar pessoas já dependentes da droga. É bem verdade que as tentativas anteriores para desenvolver vacinas contra drogas de moléculas pequenas, incluindo metanfetamina, nicotina, cocaína e morfina, acabaram todas se mostrando infrutíferas. Mas as coisas podem ser diferentes desta vez. / TRADUZIDO POR ALEXANDRE HUBNER
© 2017 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. TRADUZIDO POR ALEXANDRE HUBNER, PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM.
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(IJzendoorn/iStock)
Ampola contém sangue e outras 13 substâncias, como codeína e metanfetamina - e um detalhe que a torna ainda mais perigosa que as drogas comuns
Por Bruno Garattoni
A polícia de Bucks County, na Pensilvânia, foi a primeira a obter uma ampola da droga, que tem a aparência de um líquido vermelho e é conhecida como Blood (sangue, em inglês). É uma mistura de sangue humano com fentanyl, um analgésico opiáceo extremamente potente. Porém, testes realizados na amostra revelaram que, além de sangue e fentanyl, ela também continha codeína, efedrina, THC e metanfetamina, totalizando 13 substâncias.
Segundo a revista americana Popular Science, que relatou o caso, a ampola continha 11 miligramas de metanfetamina – uma dose inteira. Isso afasta a possibilidade de contaminação acidental (quando uma pessoa utiliza drogas injetáveis, uma pequena quantidade do seu sangue, incluindo resíduos de drogas, pode voltar para a seringa). Ou seja: alguém realmente misturou sangue humano com fentanyl e metanfetamina, com a intenção de criar uma nova droga.
Como é injetável, o Blood pode transmitir HIV e outros vírus, mas também apresenta um risco adicional: a incompatibilidade sanguínea. Se uma pessoa receber sangue de um tipo incompatível com o dela, isso irá disparar uma reação imunológica potencialmente letal – pois cria coágulos sanguíneos que podem levar a acidentes vasculares ou parada cardíaca.
Fonte: SuperInteressante
Olhos fixos na tela do game: longe da realidade fora das máquinas (Foto: Thinkstock)
Games e mídias sociais operam na lógica de várias drogas, com feedback e recompensas
O tempo gasto por crianças e jovens em tablets, celulares e similares preocupa pais e especialistas. Ansiedade, distúrbios do sono, isolamento e dispersão são relacionados ao abuso de eletrônicos. Filmes e jogos na infância e redes sociais e games na adolescência –vitaminados pela portabilidade dos aparelhos – têm afastado as novas gerações da realidade fora das máquinas, reduzindo o aprendizado de habilidades sociais e motoras. Fazer amigos, praticar atividades físicas e trabalhar em equipe são diretamente comprometidos pelo excesso de interação digital.
Nos Estados Unidos, médicos estão intrigados com a queda do consumo de drogas nos últimos dez anos entre jovens. No mesmo período, aconteceu uma explosão do uso de smartphones. Em 2015, uma pesquisa constatou que americanos entre 13 e 18 anos gastavam cerca de seis horas diárias em frente à telinha. A hipótese é que substâncias químicas e celular proporcionam efeitos parecidos (como prazer e estímulo mental), com a vantagem de o último ser legal e incentivado desde cedo, daí a substituição de um por outro. Quem nunca emprestou o aparelho ao filho pequeno para aplacar uma crise de choro?
Games e mídias sociais operam na lógica de várias drogas, com feedback e recompensas. Os jogos são altamente sensíveis aos nossos anseios – respondem mediante comandos. E trazem a expectativa de vitória (nunca a certeza), o que mantém o usuário sempre disposto a mais uma rodada. O mesmo raciocínio se aplica às curtidas, views e compartilhamentos – são imprevisíveis e afagam (ou ferem) egos.
A dopamina, neurotransmissor responsável pela sensação de bem-estar, é ativada quando cumprimos metas. Adictos apresentam deficiência dela e abusam para conseguir a próxima dose. Entender e tratar as causas de excessos relacionados à tecnologia – eles não são a raiz, mas a expressão de outros desequilíbrios – é tarefa multidisciplinar e urgente. Sob pena de gadgets e seus usos transformarem-se em problema e não solução.
Enquanto a dependência tecnológica nos desafia, drogas psicodélicas parecem à beira da redenção. LSD (uma bem conhecida droga dos anos 40), psilocibina (encontrada nos cogumelos mágicos) ou ecstasy têm despertado interesse crescente de pesquisadores e usuários com novas aplicações. Apesar de ilegal, a administração de microdoses de LSD para melhorar a criatividade, concentração e ânimo virou moda entre americanos que buscam incrementar o desempenho mental ou tratar a depressão resistente a tratamentos convencionais. Substâncias alucinógenas vêm obtendo financiamento para pesquisa em instituições renomadas, principalmente por seu potencial terapêutico.
O uso de ecstasy (metilenodioximetanfetamina ou MDMA), por sua vez, ganha adeptos entre os que sofrem de estresse pós-traumático, mal que acomete pessoas envolvidas em situações de violência. Ele aumenta a sensação de confiança nos outros e a clareza sobre o trauma, auxiliando no enfrentamento do problema. Já em estudo entre humanos, há perspectiva de ser aprovado como medicamento pelo Food and Drug Administration (FDA) até 2021.
Em tempos de Inteligência Artificial e intensa competição no mercado de trabalho, é provável que cérebros ”turbinados” por fármacos ou drogas psicodélicas tornem-se um fenômeno relativamente comum. Quais as consequências dessa prática no longo prazo? Não há respostas. Há testes em ratos que após um longo período de administração de microdoses de LSD apresentaram comportamento agressivo de tipo psicótico.
Há os que propõe outro caminho para a melhora da performance funcional ou mesmo da existencial: a meditação. Viagens psicodélicas e meditação avançada ambas oferecem meios para a chamada “dissolução do ego” – a redução da noção de si, que permite experimentar o mundo que nos cerca de outra forma, reavaliando assim prioridades e nossa própria forma de ser e agir. A meditação transcendental reconhecidamente contribui para a melhora de vários aspectos da saúde física e mental – funções cognitivas são um deles.
A complexidade da vida contemporânea exige mais e mais de nossas capacidades intelectuais e emocionais. Seja pela ingestão de aditivos ou por via da meditação seguimos em busca da superação permanente para que... para que... para que mesmo?
*CEO da Dentsu Aegis Network Brasil e Isobar Latam
Fonte: Época